quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Bashô (1644-1694)

Minha querida amiga:
a questão que eu sempre me coloco é a seguinte:
o Algo é uno e simples.

Bashô, quando lhe indagaram o que é o Espírito,
poderia ter dito conceitos e tal, mas apenas pronunciou:
o Espírito é Aquele que consegue "ver a lágrima no olho do peixe".

Há 3 elementos da vida nessa simples frase: lágrima, olho, peixe.

Quanta vida numa só linha de frase, não é?

Ver as coisas externas ou escutar a sabedoria externa de frases feitas
ainda não é ver "a lágrima no olho do peixe".

Ver a lágrima separada do olho do peixe: isso é grosseiro: tosco.

Um exemplo de frases grosseiras:

Potencializo com o fim de influenciar. Comandando a sabedoria, selo o processo do livre-arbítrio com o tom harmônico da radiação. Eu sou guiado pelo poder do fogo universal. Assumo o meu próprio poder e nada fora de mim pode interferir em minha realização.

Onde está a vida dessas frases? O sabor?
E não é do sabor que vem a palavra sabedoria?

Você, minha querida amiga, tem uma língua natural e esta língua está se diluindo em aforismos. Eu, que vi você nascer para tua língua, percebo isso claramente.

Não vá para fora, retorne ao sutil, à lágrima no olho do peixe.

Ver a lágrima no olho do peixe é o mesmo que escutar o vento até que ele adormeça na palavra: aos poucos o vento aprende a acordar e a palavra também desperta.

Eu poderia ler a Bíblia inteira ou saber todos os kins; ler todos os poemas; escutar Stravinsky e Bach; e ficaria ainda mais cego e surdo, pois enquanto eu não "ver a lágrima no olho do peixe" eu nada serei.

Pense nisso e se desapegue de tudo aquilo que não seja tua voz própria: sal de tua língua: sabor de teu orvalho: lágrima no teu olho de peixe.

Depois que retornares, sim, podes ler os kins: ler até bula de remédio, histórias em quadrinhos, ver o Faustão, que nada disso te diluirá.

Emile Joachim Constant Puyo, 1900

No dia seguinte estava Juan ansioso por ter ao pé de si a mais bela espanhola do Casino de los Toros. Convidou o vento a ir com ele ao bairro de Carrancal, à noite, para chupar umas ancas, beber tequila, comer flores.

Pegam o tílburi e, no caminho, percebem – Juan e o vento – que árvores passam por eles, desesperadas, sempre desesperadas as árvores.

Agora, se estão bem aqui, diante do Casino de los Toros, é porque não ficaram em casa e já solicitaram ao garçom que os apresente às mulheres.

Juan não aceita a loura, mas aceitou a espanhola, uma verdadeira princesa da Babilônia. Felizmente, lembrou-se da promessa que a si mesmo fizera de ser forte mas terno com as mulheres.

Foi a dos recantos do Casino de los Toros e devorou cada fio de cabelo da espanhola. O vento a tudo espiava, sem pênis, e por isso se enforcou.