sexta-feira, 29 de maio de 2009

Uma carne exposta para que ele acaricie. É assim que sinto quando, meticulosamente, ele me despe de todas as peles e me toma por todas as raízes e nervos.

Vamos construir um palácio, ele diz, vamos mudar pra Veneza, vamos rir pelas ruas, dormir embriagados. Vou te arrancar todas as dermes, todas as noites, vou te despir das máscaras, vou te deixar como és, ele diz. Faremos baderna em igrejas, gritaremos palavrões da janela, levaremos os cachorros da rua pro nosso apartamento. Vou lhe fazer um filho e uma tela expressionista.

Eu ainda não entendi se é loucura ou arrebatamento. Meus pés no chinelo suam, não consigo correr sem cair e ele me alcança, me retoma aos beijos. Ele me mantém no laço ardido do amor e ódio, do bem e do mal. Esse amor é filho da guerra, eu digo, somos inimigos. Ele ri, toma calmamente outro gole, me pega pelo braço e me arrasta até o quarto mais próximo. Ali entendo como sou sempre o país mais fraco. Terrorista, eu grito. Ele me lambe todos os vãos, me morde as sobras, me engole. Nossa febre é vida, meu amor, ele sussurra me arrancando a orelha.

Fadigamos alguns minutos, abraçados. Levantamos e saímos rindo pela rua, chutando pedrinhas e falando obscenidades para que as velhotas de portão nos escutem.


Samantha Abreu

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