quinta-feira, 6 de março de 2008


Fotógrafo anônimo
JAGUAR SOBRE UM MURO DE QUARTZO

O jaguar luminoso
sobre o muro de quartzo
é a noite em chamas;
é a trama da água penetrada de sol, seu movimento
cadencioso.
Sobe ao zênite de seus domínios,
adentra a claridade. No amplo
espaço abrupto, sua pele constelada é um lampejo,
o doce e morno florescer do cristal,
um traço breve sobre o gelo.
A pedra e o céu se tocam;
astros escuros e imensidão.
Templo de inalterada transparência,
o dia sustém e oferenda
a preamar noturna.



Poema de Coral Bracho traduzido por Josely Vianna Baptista

"Sunyata", em japonês, siginifica "vazio".
Vaso japonês
NAS ENTRANHAS DO TEMPO

O tempo cede
e entreabre
sua delicada profundidade (Portas
que protegem umas às outras;

que entram umas nas outras; traços,
rastros de mar.) Um outono
de lenhos e frondes. Em seu fundo:
A espessura translúcida do prazer; suas heras íntimas:
Ouro:
foliações de luz: Fogo que se enraíza no metal florescido,
e um musgo fino,
incandescente.



Poema de Coral Bracho traduzido por Josely Vianna Baptista

Joel Salcido


O VISIOTÁRIO

Lâmpada, não esquente.
Da parede saiu um braço magro de mulher.
Era pálido e tinha veias azuis.
Os dedos estavam carregados de preciosos anéis.
Quando beijei a mão, assustei-me:
Estava viva e quente.
Arranhou-me o rosto.
Peguei uma faca de cozinha e cortei algumas veias.
Um grande gato lambeu graciosamente

o sangue do chão.
Entretanto um homem de cabelos arrepiados subiu
Por um cabo da vassoura encostado à parede.


Poema de Jakob van Hoddis, traduzido por Claudia Cavalcanti

"Kami", em japonês, significa "vento".

A poesia parece estar mais do lado da música e das artes visuais do que da literatura. Ezra Pound acha que ela não pertence à literatura e Paulo Prado vai mais longe: declara que a literatura e a filosofia são as duas maiores inimigas da poesia. De fato, a poesia é um corpo estranho nas artes da palavra. (...) Poesia é a arte do anti-consumo. A palavra ‘poeta’ vem do grego ‘poietes = aquele que faz’. Faz o quê? Faz linguagem. E aqui está a fonte principal do mistério. (...) Para o poeta, mergulhar na vida e mergulhar na linguagem é (quase) a mesma coisa. Ele vive o conflito signo x coisa. Sabe (isto é, sente o sabor) que a palavra ‘amor’ não é o amor — e não se conforma... (...) O poema é um ser de linguagem. O poeta faz linguagem, fazendo poema. Está sempre criando e recriando a linguagem. Vale dizer: está sempre criando o mundo. Para ele, a linguagem é um ser vivo. O poeta é radical (do latim, radix, radicis = raiz); ele trabalha as raízes da linguagem. Com isso, o mundo da linguagem e a linguagem do mundo ganham troncos, ramos, flores e frutos. É por isso que um poema parece falar de tudo e de nada, ao mesmo tempo. É por isso que um (bom) poema não se esgota: ele cria modelos de sensibilidade. (...) O lingüista Chomsky distingue dois níveis no fato lingüístico: o nível da competência e o nível do desempenho. O nível de competência refere-se ao nível de domínio técnico da linguagem (...). O nível do desempenho é aquele em que o falante cria em cima do nível de competência. É claro que esses níveis não são separados. (...) Muita inibição ao nível do desempenho é provocada pela insegurança no nível da competência. É nisto que se apóia a censura, de fora e de dentro (auto-censura) para impedir que você crie. Vamos reabrir ambas as válvulas.”


Décio Pignatari
7 guarda-chuvas invencíveis

William Mortensen


Dora Maar


Norman Mauskopf


Cartier Bresson


Baron Raimund von Stilfried, 1880


Alexis Mazourine, 1893