terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Hans Hartung


O PRÍNCIPE RESSUSCITA O GRÃO DE CHUVA

Eu te tratei como príncipe, meu Deus,
mas foste mau com a espécie.

Dizimaste inumeráveis chuvas
que estavam suspensas aos quatro ventos.

Entre os teu longos dedos brancos,
a negra ardósia de nosso túmulo.

Como não te comoveste com tantas
ondas tenras de constelações sumindo?

Se em teu coração celeste houvesse
apenas a sede de alcançar a estrela,

se evaporaria do jardim a morte.
Entre barqueiros acordaríamos leves

--- e príncipe que és, com olhos de céu ---
ressuscitarias cada grão de chuva dizimada.

TABUINHA DE BARRO

Com cálamo o mandarim fixa
a elegância do vento na tabuinha de barro.

O vento leva embora o vento.
A elegância adere à tabuinha de barro.

O mandarim lava-se de toda agonia vã,
depois adormece no areal.

Anônimo
SONETO DA RENDIÇÃO ARCANJA

Eu e a Arcanja rolamos no areal.
Víbora que se torce no fogo, grito: me abençoe!
A Arcanja não quer nem me escutar.
Rolamos pelas urzes, pelos precipícios.

Volto a gritar: me abençoe!
A Arcanja sabe me cravar sua íris de ira.
Pede meu escalpo, minhas ninfas,
meu vocabulário, minhas unhas.

--- Me abençoe!
--- Não!
--- Me abençoe!

--- Não!
Sento sob as olaias e, de forma serena,
tento pela última vez --- a Arcanja me abençoa.